sábado, 10 de janeiro de 2015

Encontro


Enquanto ela falava, a alça do vestido de algodão lhe escorregava pelo ombro, revelando mais do que deveria. Ela, contudo, não se importava, sabia que o colo bonito não trazia as marcas que carregava na alma. Sentia o olhar de desejo do rapaz a sua frente, e gostava da sensação de poder que isso lhe causava.

Ele, por sua vez, admirava a força daquela mulher que gesticulava e falava sem parar, intercalando as frases com meio-sorrisos que deixavam entrever os dentes brancos e alinhados.

Nunca desejara tanto uma mulher, nunca estivera diante de uma como aquela. O cabelo escuro caindo delicadamente no rosto, o nariz afilado, o jeito despretensioso como mordia o lábio inferior enquanto pensava na próxima frase, tudo parecia naturalmente estudado. Mas não era sempre assim com as mulheres interessantes?

Ele, no entanto, não ousava avançar, nunca lidara bem com a rejeição e temia o estrago que a recusa dela pudesse lhe causar. Se sufocasse o desejo com afinco, talvez ela nem percebesse que tudo que ele queria era saltar sobre a mesa e tomá-la nos braços.

Tinha esse pensamento em mente quando o garçom chegou com a conta, que ele prontamente pagou, não sem uma tentativa de protesto dela, logo abafada. Então lembrou que estava em um bar, cercado de gente. Mais um pouco e estaria de volta ao quarto e sala vazio, entregue à solidão conhecida, diante da tela branca do computador, experimentando uma sensação tão diversa da que sentia agora.

O que o impedia de convidá-la a sair dali para que ela visse uma de suas fotos que tanto a encantaram semanas antes? Era um bom pretexto, afinal não fora o interesse dela por seu trabalho que os aproximara?

Faltava-lhe coragem, porém. Melhor seria encerrar o assunto e marcar outro encontro em um bar, quem sabe uma bebida, então, o ajudasse. Mas e se ela não aceitasse? Aquela poderia ser sua única oportunidade.

Pronto, estava decidido, não perderia a chance, iria em frente, que ela dissesse não, que recusasse, que nunca mais quisesse vê-lo, pouco lhe importava, a dúvida se dissiparia ali e não o devoraria durante dias.

-- Preciso ir – disse ela com ar descompromissado.

E então ele se levantou, puxou-lhe a cadeira e despediu-se, não sem antes lhe agradecer pela oportunidade.

E partiu. Cinco minutos depois, já do outro lado da rua, xingava o rapaz que passava de moto e lhe molhava o casaco recém-lavado no tintureiro japonês do bairro, que lhe cobrara os olhos da cara.