segunda-feira, 27 de julho de 2015

Iscas

Outro dia, na página deste blog no FB, disse que as baladas que cobram meia entrada de mulheres o fazem não apenas porque elas consomem menos, mas porque usam as mulheres como ‘iscas’ para atrair homens. Muita gente não entendeu, então resolvi explicar.

Há alguns anos fui a uma dessas festas em que mulheres não pagavam consumação até a meia-noite. Deparei-me com um cenário deprimente: dezenas de meninas, algumas certamente menores de idade ingerindo toda a bebida alcóolica que conseguissem. Logo depois, os homens começaram a chegar e encontraram várias meninas bêbadas e alegres. Não devem ter achado ruim, certo?

O hábito de embriagar a mulher para conseguir dela vantagens sexuais é antigo. O cinema eternizou a célebre cena em que o cavalheiro encontra a moça desconhecida e solitária em um bar e resolve lhe pagar uma bebida.

Oferecer bebidas ou preços mais convidativos e entradas gratuitas, selecionar moças bonitas em filas de boates ou criar ‘promoções’ para atrair mulheres são apenas uma variação desse costume que as festas universitárias e as baladas atuais aprimoraram. Não são raros os casos de estupros e abusos nessas festas, muitas vezes praticados pelos próprios colegas da vítima embriagada (aqui faço um breve parênteses apenas para que não haja dúvida: álcool não é desculpa para estupro, esteja a vítima ou o agressor bêbado).

As mulheres são ensinadas a se respeitar, a se dar ‘valor’, o que significa, em outras palavras, ter contato íntimo apenas com quem conhecem bem a ponto de estabelecerem um relacionamento. Toda mulher que resolve agir de modo diferente tem de quebrar uma série de regras e conceitos pré-concebidos que lhe foram empurrados durante anos. Acredite, não é algo fácil. O álcool, muitas vezes, funciona como um empurrão extra para a “liberdade”.

O problema é que essa liberdade é falsa. A verdadeira liberdade sexual implica saber impor suas vontades, arcar com as responsabilidades de seus atos, ter autoconfiança e autoestima elevadas. Poucas mulheres podem se dar ao luxo de se considerar de fato livres nesse sentido. A maioria não o é.

O fato de você ser ou conhecer uma mulher que entre na balada sabendo direitinho o quê e como quer não significa que seja assim para todas. As mulheres ainda são sexualmente oprimidas, e a liberdade de fato é privilégio de poucas, muito poucas. Portanto, é hora de parar de olhar para o próprio umbigo e entender de uma vez por todas que a sociedade vende uma falsa ideia de que as mulheres são livres para usufruir dos benefícios, inclusive financeiros, dessa pretensa liberdade.

Não se iludam: para exercer a própria sexualidade sem preconceitos e com segurança é preciso muito trabalho, muito questionamento, muito autoconhecimento, muita segurança. Caso contrário ela é falsa. E a pretensa liberdade é, muitas vezes, pior e mais perigosa que sua ausência.


*Texto originalmente publicado na página do "Quebrando o Tabu"