terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Feminismo mal compreendido

Outro dia, uma moça famosa disse em uma entrevista que não se considerava feminista porque achava que o feminismo era cheio de regras e ela queria ser livre para pensar por si. Nos comentários, muitas mulheres discordavam dela, algumas de forma bem agressiva, enquanto outras concordavam e aplaudiam a “coragem” de sua declaração.

Nós, feministas, no meu entender, em vez de crucificarmos a moça, deveríamos tentar entender os motivos que levam tanta gente a pensar como ela. Por que um movimento que luta pela igualdade de direitos e preza a liberdade de escolha passou a ser visto como uma cartilha de comportamentos sectários que afastam aquelas que deveriam atrair?

Não sou pretensiosa a ponto de achar que entendo todos os motivos de o feminismo ser, muitas vezes, visto como uma seita religiosa. Mas arrisco alguns palpites, pois o atrevimento é uma das minhas características pessoais:

1) Falta de informação correta
Muita gente não entende exatamente o significado do feminismo, e acaba reproduzindo meia dúzia de bobagens que escuta por aí. O feminismo é, a grosso modo, um movimento que luta por direitos iguais e para que as mulheres se libertem dos padrões patriarcais que as oprimem. Não é equivalente ao machismo, como muitos pensam. Existem várias vertentes de feminismo, com características diferentes. Não pretendo descrevê-las aqui, mas há farta literatura a respeito, para quem se interessar.

2) Má-fé

Algumas pessoas sabem exatamente no que consiste a luta feminista, apenas não concordam com ela, e em vez de apresentarem argumentos contrários, acham mais simples difamá-la. Mentem descaradamente, atribuem-lhe reivindicações falsas (acreditem, já vi gente dizer que feminista é contra as mulheres transarem de quatro!), reproduzem falas sem contexto, caluniam e agridem as feministas com o intuito de desqualificá-las. Essa tática, por assim dizer, é extremamente comum e tem surtido efeito não é de hoje.

3) O próprio movimento, ao se deter em brigas internas e problematizações excessivas, inúmeras vezes acaba afastando as mulheres

O feminismo, como todos os movimentos sociais, é feito por seres humanos, pessoas de várias idades, níveis sociais, vertentes e pensamentos, portanto é cheio de imperfeições e discordâncias e está em constante construção. Muitas vezes, nós, feministas, perdemos tempo demais ao problematizar e discutir questões sem importância, e nos restringimos a apontar o dedo umas para as outras em vez de nos atermos às nossas reivindicações e à luta por direitos iguais. Acabamos sendo intransigentes e confundindo a discussão sobre as questões relacionadas à mulher com pitacos na vida alheia. Esse comportamento afasta aquelas que se sentem julgadas em vez de acolhidas e dá margem para fomentar as bobagens que muitos propagam sobre o movimento.

Por fim, que fique claro: não existe cartilha de comportamento feminista ideal ou carteirinha que ateste o nível de comprometimento com o feminismo. Ele não se importa como as mulheres transam, como lidam com seus pelos ou se vestem nem pretende “destruir” os homens. Sua luta é por direitos, para que as mulheres acreditem em si e se fortaleçam para escolher com liberdade, livres dos padrões que nos são impostos há séculos.


*Texto originalmente publicado na página do "Quebrando o Tabu"