Qualquer mulher que já tenha ficado sozinha em um carro com
um homem desconhecido conhece o medo de se tornar mais uma das inúmeras vítimas
de abusos sexuais ou de estupro.
Não à toa, muitas mulheres desenvolvem técnicas para não
demonstrar nenhuma simpatia que possa ser entendida como consentimento para uma
intimidade forçada, como não tirar os olhos do celular e responder
monosilabicamente apenas quando não houver alternativa. Há quem envie a placa
do carro para um parente e até quem simule uma conversa com um namorado
imaginário no telefone, para se sentir protegida.
No entanto, nenhuma estratégia evitou os incontáveis casos
de abuso físico, verbal e sexual e de estupro envolvendo motoristas de
transportes privados no mundo todo. São
histórias de assédio durante as corridas, de motoristas que violam os códigos
de segurança e mandam mensagens para as usuárias, de violências físicas e
sexuais.
Veja também: Violência de gênero nas universidades
A empresa americana Uber é a que mais coleciona ocorrências
no mundo. De 2012 a 2015, foram mais de 6 mil denúncias de agressões sexuais contra
seus motoristas colaboradores. O ex-presidente da multinacional, Travis
Kalanick, renunciou ao cargo em junho deste ano, após acusações de funcionárias
acerca do sexismo reinante na empresa.
O machismo (e tudo que ocorre em decorrência dele) é um
fenômeno estrutural. Nenhuma mulher está de fato segura em nenhum lugar. Abusos
sexuais ocorrem em universidades, escolas, transportes, empresas e até dentro
de casa. São praticados por desconhecidos e conhecidos. Por ser um problema que atinge toda a sociedade,
todos deveriam se envolver na sua solução.
Embora punir o agressor seja essencial, não é o bastante. É
preciso que a sociedade condene veementemente essas formas de abuso, que não as
tolere. Para isso, as escolas, as universidades, as empresas, todos devem
assumir sua responsabilidade na prevenção de novos casos.
As empresas de
transporte privado e as que operam aplicativos, assim como as Prefeituras que
concedem alvarás para taxistas não têm feito o suficiente. Afastar o motorista
após a denúncia é o mínimo, mas não é tudo. É preciso que se invista em
prevenção, em mecanismos para facilitar e apurar as denúncias e, acima de tudo,
em políticas firmes e eficazes que desencorajem abusos sexuais.
Assédios, abusos e estupros são um problema de todos nós. No
entanto, parece que apenas as mulheres se preocupam em evitá-lo, por meio de
estratégias individuais que, por mais que nos esforcemos, não garantem nossa
segurança. Não há nada mais injusto e cruel do que deixar o problema em nossas
mãos.